31 de março de 2009

OS TRANSPORTES

O Primeiro carro a motor na Ilha do Pico

O trânsito não atrapalhava ninguém. Guardo na minha memória a chegada do primeiro automóvel a gasolina à freguesia de São Caetano. Era um Austin cujo proprietário era o Jorge Brum, filho do Sr. Manuel de Brum que tinha regressado da América onde parece ter amanhado bem.
Meu pai contava com muita piada a passagem do primeiro carro a motor pela freguesia. Foi assim: Na missa Dominical, por altura dos anúncios ou homilia, o pároco anunciava que, quem quisesse ver passar um carro sem ser puxado a bestas, estivesse atento. Mas, em cima duma parede. À tarde iria passar então o primeiro carro a motor na Ilha do Pico. Isto no ano de 1920.
Ele tinha razão. À tarde de facto passou o dito carro, e até parou, mas já todo esfarrapado de arrastar nas hortênsias, e até nas paredes.
A experiência do Augusto Pau de Lérias era pouca, apesar de ter ido a Lisboa no vapor de 12, aprender a manobrar aquele novo engenho, que era bem diferente do carro puxado a bestas, a que estava habituado a conduzir.
Este transporte, servia quase exclusivamente para o transporte e distribuição pelas freguesias, da mala do correio. Não havia dinheiro para as pessoas se fazerem transportar de carro. Era a pé que se faziam grandes percursos. As pessoas de São Caetano quando por qualquer razão iam ao Tribunal da Comarca que estava situado em São Roque, a cerca de 40 quilómetros, o que ainda hoje acontece, normalmente faziam-no pelos matos, atravessando a corta-mato durante a noite.
Consta-se que certa vez, um cavalheiro de São Caetano, cujas famílias bem conheço, quando ia numa dessas travessias pelos matos, encontrou-se com outras pessoas doutra freguesia. Fez-se doente, manquejando, até que um dos companheiros teve pena dele e pegou-lhe às cavalitas.
Chegados ao Cais do Pico, quando o outro o arreou no chão, largou uma grande gargalhada e disse-lhe: Nosso Senhor te pague que assim vim muito melhor. Como era de esperar, o transportador atirou-se a ele mas, como as forças era menores, ficou assim mesmo.
Só mais tarde, um ou outro mais abastado investiu na bicicleta. Primeiro o Carraxana da Terra do Pão, um serrador de madeiras, e depois alguns dos muitos curtidores de peles que existiam em São Caetano.
Era o seu meio de transporte para se deslocarem com as tiras de sola metidas num saco, rumo às freguesias mais longínquas do Concelho.
Recordo aqui uma cena com o curtidor Manuel Jorge (do Alto), que, arriscando a primeira viagem sem saber ainda governar bem o seu trem, ao ver uma velhinha a atravessar o caminho na sua frente na freguesia de São Mateus, atrapalhou-se de tal modo que, sem atinar a apertar a pêra da buzina ou travar, gritava: Arreda-te velha… arreda-te velha!!! A velha não se arredou…Pronto… lá foram os dois para o chão, embrulhados na bicicleta.

O PRIMEIRO AVIÃO

Foi na geração anterior à minha que os primeiros aviões escalaram regularmente os Açores. Recordo aqui uma história verídica do Tio Manuel Lourenço que muito bem conheci, que encontrando-se a roçar nas pastagens altas, juntamente com outras pessoas, que, ao ver nos céus “aquela ave” a fazer tanto barulho, ajoelhou-se, e pediu a nossa Senhora: Ó avezinha de nossa Senhora, não caias em cima de nós.
O Tio Manuel Lourenço era aquele simpático velhinho lá de São Caetano que, vendo levantar-se um grande temporal, estava por dentro da sua janela vigiando as suas batatas brancas na horta. Prevendo o pior, ou seja: a perca de todo o seu trabalho e a falta que as batatinhas tanto lhe iriam fazer, ao ver este a dar-lhe por todos os lados e estas já quase por terra, exclamou:
“Nosso Senhor não é tanto bom como o fazem”. Todo zangado pegou numa foice, vai às batatas, e tratando mal o vento tal como o D. Quixote diz: Não as vais picar todas sozinho, e zás… lá se foi o resto.

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