31 de março de 2009

O MÉDICO DE SÃO CAETANO

O SENHOR CORREIA

Manuel Correia da Silva, natural da Ilha de São Miguel, veio para São Caetano por casamento com a senhora Anastácia Silva que lá residia, na companhia do Pároco da freguesia, o Padre João Goulart, seu tio e padrinho. Ele era o Regedor e tinha a maior loja da freguesia – a Cooperativa - mercearia, líquidos, fazendas, vidros, etc., o correio e mais tarde o telefone público. Pessoa muito bondosa, merecedor de todo o respeito e consideração, a quem quase todos deviam muitíssimos favores e atenções pelos bons serviços que lhes prestava. Ele, com os fracos recursos de que dispunha, fazia muitíssimas operações, algumas com certa delicadeza, quase milagres.
Eram dedos, braços e pernas cortados com foices e machados, eram rapazes com as cabeças rachadas, eram as mulheres com os peitos infectados, nomeadamente por altura dos partos, a quem os abria, era uma simples dor de cabeça ou de dentes, a quem aconselhava e vendia o respectivo comprimido, etc. etc. Fazia os curativos a quantos lá aparecessem, ali no quarto de dentro, ou do cofre, como era conhecido, onde havia um velho banco corrido de madeira e um balde em zinco com asa de verga, para pôr os pensos usados e aparar o pingo da água oxigenada e da tintura e onde colocava o penso substituído, etc. Utilizava os seus produtos, as suas ferramentas, desinfectantes, agrafos, etc., sem cobrar um cêntimo a ninguém. Largava de imediato tudo o que estava fazendo, sempre que alguém precisasse dos seus serviços.
Alguns, como forma de reconhecimento, lá o iam ajudar a vindimar ou coisa semelhante, outros, por atenção e como forma de reconhecimento, faziam as suas compras lá na sua loja. Havia apenas um médico em cada sede de Concelho, o Delegado de Saúde, porque era obrigatório, que dava e sobrava. Não havia comparticipação na assistência médica nem nos medicamentosa.
Era praticamente a natureza a gerir a saúde das pessoas, para além duns chás caseiros feitos com ervas, e a preciosa ajuda do Sr. Correia, a mais valia para toda aquela gente. O Picaroto, normalmente era um homem forte. Diziam os de outras ilhas em ar de graça, que no Pico, quando nascia uma criança, era atirada aos pés da cama, normalmente de ferro. Se resistia, era boa para criar; se morria, não era boa para criar. Ao médico, só se ia quando a coisa era já muito grave. Morria muita gente do “mal da Avé-Maria”, a actual trombose e ou enfarte.
Recordo-me aí por altura dos meus sete anos, de, um filho duma amiga de infância da minha mãe vir a nossa casa e, dirigindo-se à minha mãe disse: Ó senhora Isabel: minha mãe manda dizer, se a senhora tem umas cuecas do Mário que possa emprestar para ir com o nosso Manuel ao Sr. Doutor. Ele está muito doente? Como se vê, umas simples cuecas, não eram para todos, naquela época.

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