31 de março de 2009

APANHA DO MUSGO

Desde muito novo que sentia prazer em chegar-me para junto das pessoas mais idosas.
Adorava ouvir as suas histórias que traduziam realidades e experiências. Em suma: a cultura do povo. Com elas aprendi muitas coisas que me ajudaram imenso pela vida fora.
Adorava ouvir as suas conversas, falando daqueles tempos com muita ternura, mas do que eu muito gostava de ouvir, eram os “Adágios Populares “ os Provérbios.”
Por muito gostar dos adágios populares e por julgar serem uma forma de homenagear os nossos antepassados e aproveitar as suas experiências e ainda por pensar poder desta forma, dar o meu humilde contributo para que, o que eu considero jóias raras da cultura do povo e sem preço, não desapareçam totalmente aos meus descendentes, mais adiante juntarei uma boa relação desses adágios. Entretanto, gostaria de lembrar aqui alguns deles e seu relacionamento com a vida prática.

A APANHA DO MUSGO

Na minha infância, nos anos 40/50, os travesseiros, onde deitava-mos as nossas cabeças, eram cheios com musgo. Era o melhor que havia na altura. Os colchões das camas eram cheios com a casca do milho, muito bem lavada e desfiada. Eram assim os nossos colchões ortopédicos.
Era então em Janeiro – musgo inteiro – a época que existia musgo em maior abundância nas pastagens baixas e já a amarelecer, sinal da sua madureza. Era ali para os matos da freguesia de São Mateus, cujo acesso era mais suave, que muitas pessoas da freguesa iam normalmente apanhar o seu musgo. Combinavam uns dias antes, e, no dia marcado, lá seguiam os grupos em romaria madrugada cedo, para ir amanhecer ao sítio previsto. Saco debaixo do braço, bordão (cajado) na mão, farnel para o lanche, que normalmente era um quarto de bolo, dois pedaços (ou “torinhos”) de linguiça do porco ainda fresca ou dois ou três torresmos de vinha’lhos e uma laranja, tudo muito bem embrulhado num guardanapo amarrado pelas pontas e toca a palmilhar sete ou oito quilómetros para cada lado. Chegados ao sítio, cada um procurava a melhor toiça de musgo. Arrancava-se e virava-se a raiz para o sol para que este já fosse enxugando e secando, pois à tarde quando se enchia o saco, já estava mais leve.

A HORA DA MERENDA

Merendavam, descansavam e a seguir, cantavam ou assobiavam, enquanto o musgo ia secando.
Pela meia tarde, enchiam-se os sacos. Ajudavam-se uns aos outros, e, quem tinha maior colheita cedia um pouco ao outro que tivera menos sorte ou agilidade. Sacos para as costas e as mulheres e raparigas para a cabeça e, iniciava-se o regresso a casa, cantando. Já em casa, estendia-se o musgo no pátio da sala ou no eirado do tanque (cisterna de água) a enxugar durante alguns dias, sendo mexido várias vezes ao dia, para mais depressa secar. Depois, enchiam-se os travesseiros que ficavam muito fofinhos, pois o lá existente já estava em moinha. Naquela noite até se dormia que era um regalo. Sendo um ritual do mês de Janeiro, fazendo parte da tradição, era também uma festa.
Belos tempos. Tenho saudades.

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