31 de março de 2009

A FESTA DOS CORNOS

No dia 25 de Abril – dia de cornos – à tarde, fazia-se a festa dos cornos, com procissão e sermão dos cornos.
A procissão, saía normalmente do lugar do Caminho de Cima, sob a orientação do António Cabral, grande entusiasta desta festa, auxiliado pelo seu braço direito, o Manuel Branquinho, o Horácio e muitos mais. De guiões erguidos com lindas aparelhas de cornos ali desenhadas, uma coroa em arco de chapa daquela que servia para cintar as barricas do vinho, e com um grande corno preso a meio e ao alto, entre um quadrado de varas seguradas pelos “Irmãos”, uma lata com brasas contendo cornos a arder lá dentro servindo de incenso, lá vinham até à Prainha, tocando búzios e campainhas e apupando aos irmãos que encontravam pelo caminho, obrigando-os a ajoelhar, beijar o corno, coroar e por vezes, a acompanhar o cortejo. Alguns, os mais desconfiados, davam o cavaco; zangavam-se e outros, perto daquelas horas, saíam de casa; fugiam por veredas e canadas onde se escondiam entre as faias. Desgraçado do que desse o cavaco, eles, os da irmandade nunca mais o largavam. Assim se percorriam as principais ruas e canadas da freguesia, procurando os irmãos para coroar. À tardinha, a festa encerrava com o tradicional sermão dos cornos. O sermão, normalmente andava à volta do corno. Haviam cornos das mais variadas bitolas. Uns eram elogiados porque eram mansos, outros criticados porque eram ariscos, zangavam-se e até fugiam, e ainda havia os que investiam mesmo a sério.
Meu pai, era dos melhores oradores para pregar o sermão. Recordo-me de algumas quadras que faziam parte do sermão:

Este dia de São Marcos
Tem que ter o seu sermão
Que este dia para nós
É dia de grande função.

Não há maior irmandade
Que a do corno retorcido
Que p’ra falar a verdade
Enfeita tanto marido

Todo o homem que é casado
E vive neste desterro
De cornos anda pesado
Sem ser bode nem bezerro.
Se alguém o corno apanhar
Meta a viola no saco
É ver, ouvir e calar
E nunca dar ao cavaco.

Podemos assegurar
Bem nos termos desta lei
Que ninguém pode afirmar
Desta água não beberei.

Os cornos que estamos vendo
É uma praga geral
Que cada um vai roendo
Conforme sente o seu mal.

Com o final do sermão, terminava também a festa. Uns contentes outros tristes, com sorrisos amarelos, cada um para suas casas. Alguns iam ajustar contas com a companheira, que todo o dia esconjurou quem tivera tal ideia de, por aquele processo, festejar aquele dia.

Sem comentários:

Enviar um comentário